DEUSA THEMIS

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domingo, 7 de setembro de 2014

O NEXO DE CAUSALIDADE E OS CRIMES OMISSIVOS IMPRÓPRIOS

             O nexo causal pode ser definido, conforme o artigo 13 do Código Penal, como o elemento de ligação entre a conduta e o resultado produzido, que somente é imputável a quem lhe deu causa. Em tempo, causa é a ação ou a omissão sem a qual o resultado não teria acontecido.
 As teorias utilizadas para apontar o nexo causal são a "Teoria da Equivalência dos Antecedentes" e a "Teoria da Causalidade Adequada". A primeira - também chamada de "conditio sine qua non" - é a adotada pelo Código Penal Brasileiro e proclama que todos os fatos que antecederam o crime dele são causa, se retirados da cadeia de antecedentes acabam por retirar o próprio crime. Vem, então, o critério da eliminação hipotética de Thyrén, que diz que se deve eliminar o antecedente e verificar o resultado e se o resultado ocorrer mesmo com a suspensão da conduta antecedente, não haverá relação alguma de causa e efeito entre comportamento e resultado. Ao contrário, é possível falar que é causa, condição indispensável (nexo causal), se o resultado não acontecer sem o antecedente.
Há, porém, uma crítica a essa teoria por ela criar uma corrente do infinito (uma cadeia de responsabilidades que vai se eternizando). Entretanto, o nexo normativo (verificação da vontade na ação ou na omissão - conduta - que deu causa ao resultado) surge para dar solução a essa crítica, pois, para ele, deve-se limitar o alcance dos antecedentes relevantes, a ação do agente deve ter importância para o resultado e deve-se, também, analisar a presença de dolo ou culpa agregado à conduta.
A partir disso, Fernando Capez ensina que:
"O nexo causal só tem relevância nos crimes cuja consumação depende do resultado naturalístico. Nos delitos em que este é impossível (crimes de mera conduta) e naqueles em que, embora possível, é irrelevante a consumação que se produz antes e independentemente dele (crimes formais), não há que se falar em nexo causal, mas apenas em nexo normativo entre o agente e a conduta. Exemplo: no ato obsceno não existe resultado naturalístico: logo, para a existência do crime basta a conduta e o dolo por parte do agente, não havendo que se falar em nexo causal."[1]
Dessa forma, o autor diz que nos crimes omissivos próprios e nos crimes de mera conduta não há a existência do nexo causal, já que não há o resultado naturalístico; nos crimes formais o nexo de causalidade não tem relevância para o Direito Penal, pois o resultado naturalístico não tem importância para a consumação típica; nos crimes materiais, diferentemente, há a presença deste nexo, visto que também há o resultado naturalístico; já nos crimes omissivos impróprios, "não há nexo causal físico, pois a omissão é um nada e o nada não causa coisa alguma"[2]. Entretanto, para fins de responsabilização penal, por uma ficção jurídica, a lei considera existir um elo entre o omitente e o resultado naturalístico sempre que estiver presente o dever jurídico de agir, de modo que, havendo dolo ou culpa, responderá pelo evento.
Damásio de Jesus, portanto, defende que não é certo dizer que a omissão produziu o resultado, pois só há ações no plano físico e:
"A estrutura da conduta omissiva é essencialmente normativa, não naturalística. A causalidade não é formulada em face de uma relação entre a omissão e o resultado, mas entre este e a conduta que o sujeito estava juridicamente obrigado a realizar e omitiu. Ele responde pelo resultado não porque o causou com a omissão, mas porque não o impediu realizando a conduta a que estava obrigado. A omissão é normativa e não causal."[3]
Assim, são consideradas obrigadas a impedirem o resultado naturalístico (alteração no mundo dos fatos) todos aqueles elencados no § 2º do artigo 13 do Código Penal:
“§ 2º. A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.”[4]
Entende-se, então, que o Código Penal descartou a teoria das funções (que determinava que o garantidor seria o agente que  possuía uma relação mais próxima e estreita com a vítima, mesmo sem qualquer obrigação legal entre os dois) e adotou o critério das fontes formais do dever de garantidor (o elencado no § 2º do artigo 13 do Código Penal vigente).
Portanto, só há relação causal quando também há o dever de agir. Capez enfatiza ainda que "embora não tenha dado causa ao resultado, o omitente, entretanto, será responsabilizado por ele sempre que, no caso concreto, estiver presente o dever jurídico de agir. Ausente este, não comete crime algum"[5].
Vale ressaltar que, segundo o Supremo Tribunal Federal, "a causalidade, nos crimes comissivos por omissão, não é fática, mas jurídica, consistente em não haver atuado o omitente como deveria e podia, para impedir o resultado"[6].
Voltando aos critérios legais que determinam o dever de agir (§ 2º do artigo 13 do Código Penal), a primeira alínea trata de um dever oriundo de uma imposição legal (como, por exemplo, o caso de uma mãe que, de acordo com o Código Civil de 2002, tem o dever de cuidar do filho, porém, por negligência, ela não alimenta mais seu bebê recém nascido e ele vem a falecer por conta de inanição, ela responde, então, por homicídio culposo); a segunda alínea diz sobre o sujeito que assumiu essa posição de garantidor por contrato, liberalidade ou outra forma (tem-se o exemplo da babá que, por contrato, tem a obrigação de cuidar da criança, porém, por descuido, deixa que a criança caia numa piscina e morra afogada, assim, a babá responderá pelo resultado).
Portanto, o sujeito será considerado autor da omissão quando tem a possibilidade de evitar o resultado típico e não o faz mesmo tendo uma posição de garante.
A terceira alínea é também chamada de "ingerência da norma" e diz sobre a pessoa que teve determinado comportamento que causou o risco de produção do resultado (acontece, por exemplo, com o indivíduo que joga outro na piscina, passando, por conta desse comportamento, a ter a obrigação de salvar a outra pessoa caso ela comece a se afogar).
Entende-se, ainda, que toda conduta considerada perigosa gera uma obrigação de agir, mesmo que o indivíduo não tenha agido com dolo ou que a conduta não seja ilícita.
Bibliografia
BRASIL. Código Penal. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm. Acesso em: 28 abr. 2012 .
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2004.
DE JESUS, Damásio E. Direito penal, parte geral. Vol. I. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998.
RHC-63428/SC; Rel. Min. CARLOS MADEIRA, DJ de 14.11.85.


[1] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 147 – 148.
[2] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 148.
[3] DE JESUS, Damásio E. Direito penal, parte geral. Vol. I. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 171.
[4] BRASIL. Código Penal. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm. Acesso em: 28 abr. 2012 .
[5] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 148.
[6] RHC-63428/SC; Rel. Min. CARLOS MADEIRA, DJ de 14.11.85, p. 20567.